quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

"O Inventor de Quimeras"


Aparentemente Sidney era um típico jovem morador de uma favela de São Paulo. Servente de pedreiro começou a trabalhar em uma construtora com sede no centro da cidade, aos treze anos de idade. Já naquela época via-se que o garoto vivia com a cabeça nas nuvens. Tinha a imaginação fértil, como se costuma dizer por aí. Inventava histórias e colocava-as no papel. Fazia capas e sentava no passeio admirando sua própria obra, fingindo ser um livro comprado numa livraria chique. Nessa mesma época, disse para si mesmo que compraria todos os livros que pudesse. Teria uma biblioteca particular a disposição, seria um homem culto, um professor de faculdade que ficaria rico passando a frente todos os anos do conhecimento acumulado. Entretanto, salvo o fato de estar sempre lendo (lia até embalagem de shampoo no banheiro), não foi assim que sucedeu.

Preto e pobre herdou dos pais o vicio do álcool, no qual fez com que virasse freqüentador assíduo dos botecos da comunidade, sendo conhecido pelos donos dos botequins por seus estranhíssimos hábitos. Dentre alguns, tinha essa mania de ler livros emprestados de uma biblioteca, sentado no fundo do bar, tendo como singela companhia apenas uma garrafa de cachaça. Lia romances clássicos e filosofia contemporânea dos quais adquiriu notável erudição, se analisadas as condições sociais e econômicas que teve acesso. Alem disso, fumava apenas cigarros de palha que ele mesmo fazia, dos quais dizia ele: ‘eram mais saudáveis dos que os comprados prontos’.

É realmente pouco comum ver um jovem lendo (dentre muitos outros livros) ‘A peste’ de Albert Camus no fundo de um boteco de favela, onde os freqüentadores só conseguiam escrever precariamente o próprio nome, porém isso não é improvável. Ainda mais bebendo caninha 51 (que em minha opinião é uma cachaça de péssima qualidade) e fumando cigarrilhas feitas por ele mesmo. Mas pelas feições do seu rosto cor de piche, e pela total falta de pudor em seus gestos corporais, não parecia se preocupar com o que o senso comum achava de seus hábitos e costumes. Para ele, no momento em que se sentava nas cadeiras enferrujadas dos botecos da comunidade para ler um bom autor, era como se desligasse da trágica realidade que tinha que enfrentar todos os dias quando acordava pela manhã. Visitar um outro mundo a cada livro. Conhecer culturas diferentes das quais nem imaginava existir, sem sair da favela onde viveu toda a sua vida. Essa sensação de desprendimento que ele adorava. A sensação distanciamento de si mesmo que a literatura proporciona, era indescritível para ele.

Esse conto continua.........
(To be continued)


P.S.: O tíulo acima "O Inventor de Quimeras" é o título definitivo deste conto.

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